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Conselhos de pai

Eu tive um pai bem velho. Quando nasci, ele já era um “senhor” e acima de mim havia dez irmãos, alguns com idade para serem meus pais.


Meu pai era uma figura muito interessante. Aos meus olhos, tinha características muito diferentes das que tinha aos dos meus irmãos mais velhos. É como se tivéssemos tido dois pais. Para mim, era um pai já bem mais cansado do que parece ter sido com meus outros irmãos, nascidos antes de mim.


Revendo o material que contava um pouco de suas histórias, um DVD preparado por filhos e netos no ano em que ele faria 100 anos, vi coisas que me emocionaram e hoje fazem um eco maior do que tempos atrás. São os conselhos do meu pai, Lincoln Mourão Mattos. Não foram necessariamente dados diretamente a mim, mas ele certamente as teria me dito se assim tivesse tido oportunidade.


Li com avidez algumas palavras suas. Ouvi dele coisas que nunca tinha prestado atenção, pois certamente já ouvira inúmeras vezes, mas não com o olhar de hoje. Me emocionei como se ele estivesse falando comigo.


Os pais têm o dom de ultrapassar o tempo. São eternos, não morrem. Ficam para sempre em nós, e não há coincidência quando desejamos ouvi-los. O que existe é vontade de tê-los por perto. Daí a gente fecha os olhos e é só chamar, eles vêm, de um jeito ou de outro, eles vêm e nos contam uma história, nos aconselham, nos falam palavras de conforto e nos dão o carinho de que precisamos.


Meu pai fez isso comigo hoje. Me deu conselhos, me deu carinhos, me fez rir, me fez entender muitas coisas que precisava compreender agora. E nem precisa estar mais aqui, precisou apenas ser quem era quando esteve perto de nós. Sábio, sincero, puro, verdadeiro.

Conselhos de pai, nunca passam, e não ficam apenas em nós. Estão nos irmãos que contam suas histórias e que repetem seus “causos”. Estão na vida que levava e que se eternizou, estão na alma da gente, que vez por outra se ilumina com o brilho que sua luz deixou.


Meu pai tinha alma de criança, espirito guerreiro e era um visionário. Não era um espectador da vida. Fazia acontecer. Ensinava sem fazer estardalhaço, ensinava com a simplicidade dos sábios, porque é preciso saber demais para poder ensinar. E meu pai ensinou isso. Repetia sempre: “Não importa o que vocês desejem ser, sejam um vendedor de pirulitos, mas sejam o melhor vendedor de pirulitos”. Nos dava senso de responsabilidade, de honestidade e de ética pessoal e profissional. Falava sobre missão: Você não veio para este mundo por acaso, saiba disso, dizia ele.


Ele tinha a leveza e a alegria da qual me considero herdeira. Talvez não com tanta inteligência como a dele, mas com um DNA que me orgulho de ter. Ter alegria, colocar piada na vida, falar das coisas sempre com um ar de galhofa, era a sua cara, e eu me vejo nele. É bom rir de si mesmo, é bom contar histórias engraçadas e fazer outros rirem, é bom se divertir ironicamente. Não consigo imitá-lo, faço meu gênero, mas ouvi seus conselhos sim.

Pai, tive pouco de você por perto, mas te escuto, te sinto e sigo você ainda hoje. E você que dizia que eu tinha tanto prestigio, heim? E me chamava juriti da mata! Por que? Devia ter suas razões. Quando a gente se encontrar, você me conta.



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